a dialética dos amantes




Piet Mondrian







- Acho que compreendo você - disse a Maga, acariciando-lhe o cabelo. - Você está procurando alguma coisa e não sabe o que é. Eu também. E também não sei o que é. Mas são duas coisas diferentes. Aquilo de que vocês falavam na outra noite... sim, você é mais um Mondrian e eu sou uma Vieira da Silva.

- Ah! - exclamou Oliveira - Então, eu sou um Mondrian.

- Sim, Horacio.

- Você quer dizer que sou um espírito cheio de rigor.

- Eu disse um Mondrian.

- E você não desconfiou que por trás desse Mondrian pode começar uma realidade Vieira da Silva?

- Oh, sim - respondeu a Maga. Mas você, até agora, não saiu da realidade Mondrian. Tem medo, quer estar seguro. Não sei de quê... Você é como um médico, não como um poeta.

- Deixemos os poetas de lado - disse Oliveira. - E não faça o pobre Mondrian ficar mal com a comparação.

- Mondrian é uma maravilha, mas não tem ar. Sua pintura me deixa um pouco oprimida. E quando você começa a dizer que seria necessário encontrar a unidade, então, eu vejo as coisas muito bonitas, mas mortas, flores dissecadas e coisas assim.

- Vamos ver, Lucía: você sabe bem o que é a unidade?

- O meu nome é Lucía, mas você não tem de me chamar assim - disse a Maga. - Claro que sei o que é a unidade. Você queria dizer que tudo na sua vida se junta para que possa ver tudo ao mesmo tempo, não é?

- Mais ou menos - concedeu Oliveira. - É incrível a dificuldade que você tem para captar noções abstratas. Unidade, pluralidade... Você não é capaz de sentir tudo sem recorrer a exemplos... Não, não é capaz. Enfim, vamos ver: a sua vida, por exemplo, será um unidade para você?

- Não, não creio. São pedaços, coisas que me foram acontecendo.



Julio Cortázar

O jogo da amarelinha
capítulo 19