autoconhecimento



Sim, ela sentia dentro de si um animal perfeito. Repuganava-lhe deixar um dia esse animal solto. Por medo talvez da falta de estética. Ou receio de alguma revelação... Não, não - repetia-se ela - , é preciso não ter medo de criar. No fundo de tudo possivelmente o animal repugnava-lhe porque ainda havia nela o desejo de agradar e ser amada por alguém (...) Porque a melhor frase, sempre ainda a mais jovem, era: a bondade me dá ânsias de vomitar. A bondade era morna e leve, cheirava a carne crua guardada há muito tempo. Sem apodrecer inteiramente apesar de tudo. Refrescavam-na de quando em quando, botavam um pouco de tempero, o suficiente para conservá-la um pedaço de carne morna e quieta.



Clarice Lispector

Perto do Coração Selvagem